domingo, 3 de abril de 2022

O Tio Manel da Emília!

Se me perguntarem a razão por que decidi escrever algo sobre esta personagem, direi que também eu sou conhecido, na Póvoa de Varzim, na rua onde moro, pela mesma dsignação, embora ligeiramente modernizada, Manel da Mila. Ele morava no centro do Outeiro e eu na ponta mais a norte, éramos, portanto, vizinhos.
Suponho que o casal não tinha filhos, pelo menos nunca vi uma criança naquela casa. Passavam os dois a caminho do campo, com o inseparável carro de vacas que servia para levar e trazer tudo aquilo que precisavam, como ferramentas, sementes, estrume, etc., e na volta o milho, a erva, a palha, a lenha e o resto que podem imaginar. Quem viveu, como eu vivi, nesse mundo da pequena agricultura sabe do que falo. Aos meus olhos era um casal triste que parecia carregar toda a infelicidade deste mundo.
Saí de Macieira muito cedo, com 11 anos de idade (no ano de 1955) e nunca mais lhes pus a vista em cima. Soube agora, aos estudar os registos paroquiais da nossa freguesia, que o pai dele veio de Cristelo casar em Macieira e ficou a viver em Penedo. Abaixo, podem ver uma parte do seu registo de baptismo:


Nasceu em 23 de Outubro de 1909, tinha portanto mais 34 anos que eu. Aos olhos de uma criança, um homem dessa idade é um velho. A sua mulher era descendente de uma família de apelido Gomes - havia bastantes, em Macieira - e era sua a casa onde ficaram a morar, no Lugar do Outeiro. Casou-se, em Setembro de 1942, dois anos antes de eu nascer.
E depois aconteceram mais algumas coincidências que me ajudaram a decidir escrever esta prosa (que talvez nunca seja lida por ninguém) que aqui deixo. Em primeiro lugar e por causa da Guerra Colonial, eu parti para Moçambique, no último trimestre de 1962, tendo passado o Natal desse ano longe da família. Quis o destino que nesse dia 25 de Dezembro, em que eu carpia as minhas mágoas tão longe de casa, a Tia Emília entregou a alma ao Criador, deixando o Tio Manel viúvo.
Em 1965, vim à Metrópole (era assim que nos referíamos a Portugal Continental) frequentar um curso para promoção ao posto imediato na tropa e, no Outono, regressei a Moçambique. Por coincidência, foi nesse mesmo ano que o Tio Manel da Emília deixou de se chamar assim, por se ter casado, em segundas núpcias com Maria Josefa Alves Ferreira. Imagino que a vida de um homem viúvo, com 50 e poucos anos, não fosse nada fácil, tanto pela falta de habilidade nas coisas do lar, como pela falta de ajuda com a sua lavoura que mesmo sendo de pequena monta, sempre seria demais para um homem só. Assim congratulo-me com ele pela decisão tomada em procurar noiva e oficializar a ligação.
Pois, uma coisa que não se pode negar é que o homem era rijo e sobreviveu à sua segunda esposa que faleceu, em 1999. Ele aguentaria ainda mais 4 anos, tendo morrido, em 2003, em Barcelos (suponho que internado no hospital para onde terá sido levado por doença) com a bonita idade de 94 anos.
Posto isto, fico a pensar se também eu perderei a minha Emília e ficarei sozinho até aos 94 anos, ou perto disso. Casar outra vez nem pensar, já não tenho idade nem vontade para me meter nessas corridas!

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